terça-feira, 28 de abril de 2009

PICABIA: pensamentos, aforismos & pregos enferrujados


Capa de I am a Beautiful Monster, volume de textos de Picabia, lançada pelo MIT.


Estive lendo a edição que Marc Lowenthal organizou & traduziu para o inglês, das obras do pintor, escritor & polemista francês Francis Picabia (1879-1953).

Picabia, se acreditamos nele, foi o inventor, com Duchamp, de Dada — que Tzara nos disse não significar nada. No editorial (se é que se pode chamar àquilo editorial) da revista Dada fundada por ele, 391, do volume 15, que se chamou Le Pilhaou-Thibaou, lemos que o diretor, Funny Guy (Picabia, lui-même, claro), escreve:

Le dadaïsme fut inventé par Marcel Duchamp et Francis Picabia — Huelsembeck [sic.] ou Tzara trouvèrent le mot Dada — il est devenu esprit parisien et berlinois.

O espírito parisiense, segundo Funny Guy, le directeur, nada mais é que "fantasias exteriores e espirituais"; o espírito berlinense ele se isenta de comentar, preferindo detalhar as relações entre merda & André Gide.


Capa do Pilhaou-Thibaou (1921): 5 francos, uma ninharia.

Mas não foi por isso, enfim, que comecei a escrever esta postagem: o livro tem os livros de prosa ficcional de Picabia, muito mais radicais que a mais radical prosa de Oswald de Andrade. Seria interessante inclusive comparar essas duas personæ, muito semelhantes. Oswald tambem adotou a provocação como estilo, & até mesmo aquela antropofagia eles têm em comum: Picabia escreveu seu Manifeste Cannibale Dada em 192o (haveria a revista Cannibale, também, fundada por ele no mesmo ano).

Há também seus poemas (incluindo os 18 desenhos mecanomorfos de um de seus melhores livros, o Poèmes et dessins de la fille née sans mère, de 1918), manifestos & todo tipo de provocação.



Parade Amoureuse (1917), de Picabia, mecanomorfismo que partilha com Duchamp, por exemplo, do Moulin à café (voltarei a isso, numa outra postagem, há tempo para tudo).

E aí é que está. Lendo, eu ria. Não sou da opinião que acha o poema-piada ou a provocação dessa época coisas sem importância, meros tiques. Eles tinham certamente a noção da hilaritas bem desenvolvida, mas o humor que produziam revertia filosoficamente muito do que eram as idéias feitas da sociedade.

Daí juntei ao acaso uma parte do arsenal do exímio & temível frasista que era Picabia (outra coisa que Oswald partilhava com ele, basta ler o sublime Dicionário de Bolso, onde achamos: Shakespeare: caixa de brinquedos da Renascença, ou Hitler: bigodinhos de aço). Algumas têm simpáticas atribuições. Seguem abaixo, traduzidas do inglês. Gaudete.

Femmes au Bull-Dog (1940-1942, do acervo do Centre Georges-Pompidou, em Paris): no seu estilo de cartazes de propaganda & pin-ups dos anos 1940 & 1950.


Se você não quer idéias sujas, troque-as como troca de camisa.

O único uniforme tolerável é o da sauna. (Napoleão)

Àqueles falando às minhas costas: minha bunda está olhando para vocês.

A honra é inimiga da glória.

As únicas dívidas incômodas são as que se pode pagar.

O luxo não é um prazer, mas o prazer é um luxo. (Arcanjo Gabriel)

Existem apenas dois infinitos: Deus e a estupidez. (Edgar Varèse)

A modéstia se esconde por trás do nosso sexo.

Caros revolucionários suas idéias são tão limitadas quanto as de um pequeno-burguês de Besançon.

Atormentados pelo desejo de ver suas estátuas em Paris na Place de l'Étoile, todos os presidentes do movimento DADA mijam bronze.

Se você lê André Gide em voz alta por dez minutos seu hálito começa a feder.

Toda convicção é uma doença.

Para mim, a única coisa boa que há: não fazer nada.

O humor é o canibalismo dos vegetarianos.

Feiúra é a decadência de uma convenção.

Encorajar a mediocridade de pessoas medíocres é um prazer que pertence à boa sociedade.

Nossos genitais deveriam sempre fazer sombra sobre a nossa barriga.

Homens ganham diplomas e perdem o instinto.

O único modo de ter seguidores é correndo mais rápido do que os outros.

O único jeito de se salvar: sacrificar sua reputação.

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