quinta-feira, 21 de julho de 2016

A MENTIRA DA FOLHA DE SÃO PAULO, PARA DAR FORÇA AO GOLPE

Quarto mês,
Ano I do Golpe de Estado: ditadura de Michel Temer



No domingo alguém na Folha 
gastou o estoque inteiro disso na cara


No dia 17 deste mês, mesmo sem ter prova documental, o vosso Demônio obviamente sabia que os números do Datafalha de domingo eram um conto da carochinha, & o vosso Demônio o disse.

A porteira logo depois foi aberta pelo artigo desse jornalista extraordinário, Glenn Greenwald, a quem deveremos a coragem, o tino exato & o compromisso sério com a democracia do Brasil, que, embora não tenha nascido aqui, respeita muito mais do que muitos brasileiros.

Como pus no adendo do dia 19, Greenwald e Erick Dau, do Intercept, chamavam diretamente "fraude" o episódio constrangedor desse jornaleco que de grande tem só a malandragem. Agora, com as novas informações ainda mais chocantes descobertas pela apuração do site Tijolaço (feita por Fernando Brito, com colaboração de Letícia Sallorenzo), publica uma nova reportagem  que demonstra a inversão completa do que os dados da Folha apresentaram.

Ou seja, a Folha determinou a inversão completa do que a pesquisa encontrara. Dêem uma espiada no horror:


Impossível superestimar o significado nefasto do que isso implica: compromisso direto, do jornal, com o Golpe de Estado que está se dando no país, até para derrubar qualquer linha de decência jornalística em favor dessa abominação.

Nem faz muito tempo, Tavinho, o Filho do antigo dono, levava uma porrada na orelha de Sue Branford em Londres, que ela acusava já a grande mídia no Brasil de ser claramente pró-Golpe, antidemocrática, manipuladora - coisa refletida, aliás, nos números do rebaixamento do Brasil em liberdade de imprensa, pela ONG Repórteres sem Fonteiras.

Tavinho se irritou, chamou a jornalista de "petista" (ser pela democracia & pela honestidade da imprensa é ser petista? Na Inglaterra? Tavinho está fazendo parecer que ser petista é muito melhor do que deve realmente ser), & disse que seria impossível manipular o público, que isso era uma fantasia.

Gostaria agora que explicasse o que foi que seu jornal fez no domingo. Digamos, que nome ele daria para isso? O jornal tentou fazer o quê? Eu tenho uma sugestão, mas talvez o nome que eu dê a isso seja muito parecido com o que Branford tem para essa prática.

Pensando em comprar galões de óleo de peroba & enviar para a Folha: devem ter gasto o estoque deles todo nesse domingo. E vão precisar de mais até a votação do Golpe no Senado.

domingo, 17 de julho de 2016

FOLHA: UM JORNAL A SERVIÇO DO GOLPE

Quarto mês,
Ano I do Golpe de Estado: ditadura de Michel Temer

 Otávio Frias,  fundador da Folha: tradição é uma coisa importante.

Não se sabe, ainda, a natureza da tentativa, digamos, "falhada" de golpe na Turquia (vocês certamente lembram do atentado ao aeroporto de Ataturk, em Istambul, faz um mês), assim como se deve perceber que o Brexit pegou muitas pessoas de surpresa, incluindo um monte de britânicos que supunham que seus conterrâneos teriam maior bom-senso; e que o atentado em Nice vem em boa hora para ampliar o sentimento já bastante exacerbado na Europa (& elsewhere, basta ver o caso de Trump nos EUA) de xenofobia, estilo anos 1930, que, é óbvio, vai desaguar em algo similar àquilo em que desaguaram os anos 1930, em breve, & que pessoas graúdas vão ficar ainda mais ricas negociando nessa waste land, como aconteceu também antes.

É o óbvio ululante de Nelson Rodrigues.

Esquemão básico, pura cartilha: quando o sistema de privilégios estiver em colapso, montar uma crise econômica, espalhar todo tipo de medo via mídia (doenças pandêmicas, violência urbana incontrolável, instabilidade econômica incidindo sobre os empregos, estrangeiros de zonas pobres & de conflito infestando o nosso país, o perigo vermelho dos comunas, etc), & colher o fruto doce do caos no chacoalhar das bolsas antes imóveis.

Embora a cartilha seja muito simples observando-se como se descortinam os eventos, nada saberemos sobre as coisas em sua origem, urdidas em bastidores que a maioria de nós sequer pode imaginar, atendendo a interesses cujo volume financeiro extrapola o PIB de uma porção de países, somados. Parafraseando Trevor Broom (John Hurt) no filme do Hellboy: nós vemos a marionete, mas onde está o manipulador da marionete?

"I see the puppet, but where is the puppeteer?"

Podemos no entanto (& devemos) fazer perguntas consistentes ao ver a marionete, aquilo que é criado, como num espetáculo de mágica, para desviar o nosso olhar, a nossa atenção, para um lugar conveniente, de modo que o truque passe despercebido. 

Isso é o que pessoas com alguma inteligência devem se fazer, as boas perguntas.

Uma delas seria, & bem interessante: os atentados do chamado Estado Islâmico estão atendendo a quais interesses? Ou, ainda melhor: quem sai efetivamente ganhando com os atentados do Estado Islâmico?

A resposta inteligente a essa pergunta aterroriza mais do que os próprios atentados. E essa resposta deveria, claro, orientar as avaliações do que tem havido no mundo nos últimos anos, & certamente explicaria por que a grande mídia, aqui & em outros lugares, tem feito o que em inglês se chama hate mongering, ou o incitamento ao ódio. 

Como o mágico, desvia-se o olhar para um lugar conveniente. A rainha Elizabeth, de Inglaterra - a primeira rainha daquele nome e rainha de fato, não a representante do atual parque temático inglês - disse em discurso ao Parlamento, de 1586, que "we princes, I tell you, are all set on stages" (nós, príncipes, estamos todos sobre palcos), relembrando àqueles que a ouviam que era fundamental produzir aos olhos do público uma imagem conveniente, guiar o público na direção desejável.

"Você sabe, Mestre William, eu adoro uma boa peça".

Conveniente & desejável para quem? 

Essa é uma outra pergunta, que deixo à discrição da leitora & do leitor, que certamente saberão respondê-la. 

Mas fiquemos num esquema pro domo, vamos cultivar um pouco o nosso jardim, como aprendeu até o tolo Candide, de Voltaire. Até porque o nosso jardim é vítima, no momento, de uma tremenda praga de ervas daninhas. 


Il faut cultiver son jardin

Quem está nos pregando uma peça? Vejamos apenas um caso exemplar.

A Folha de São Paulo, que se propagandeia como "Um jornal a serviço do Brasil", seria mais honesta se se dissesse "Um jornal a serviço do Golpe". Qual golpe? Ora essa, basta escolher, serve qualquer um deles, como vocês vêem acima Otávio Frias lambendo as botas do ditador, no caso, o General Emílio Garrastazu Médici. 

Hoje a Folha publica uma "pesquisa" do universalmente conhecido como Datafalha, composta com um objetivo claro. A pergunta ingênua que se fez é sobre o que seria melhor para o Brasil, Temer ficar, Dilma voltar ou fora com os dois? Em abstrato, parece uma pergunta limpinha, pura curiosidade de resto jornalística & sociológica.

O mesmo Datafalha, no final de 2014, sem interesse nenhum, dava que a intenção de voto se inclinava para Aécio Neves, repetidamente pondo o candidato do PSDB em primeiro nas pesquisas. Outros veículos de mídia, que sempre foram mais abertamente a serviço do pior, como a Veja, não ficavam no esquema sutil de "pesquisa".

Vocês, é claro, se lembram dessa singela capinha aqui (lamento postá-la, sei que é repugnante, esteticamente horripilante & dá vergonha alheia, me desculpo desde já, mas é pela sanidade do argumento):

O poder de Aécio ser mencionado em várias 
listas de delação da Lava Jato, talvez? Isso 
seria bom jornalismo, claro.

A pesquisa não colava, claro, porque Dilma Rousseff seria mesmo reeleita presidente, & na última hora, enfim, apareceu que ela estaria na frente. 

Agora há um timing sendo retomado pela mídia: aproxima-se o dia da, ah-ham,  "votação" no Senado, que como sabemos é uma das instituições fortes & honestas do Brasil, & que zela pela democracia & pelo que é justo. Em Roma, o esquema foi o de um monte de punhais & Júlio César, apunhalado, dizendo pra Cristovam Buarque, "tu quoque?". 

Perdão, me enganei: era Bruto, não Buarque.

Esse timing viu surgir alguns problemas na narrativa de legalidade da peça ridícula do Golpe, que custou aqueles 45 mil dinheiros pra legenda 45 (não sei quanto isso dá no câmbio de Judas Iscariotes, mas podemos perguntar pro liliputiano Temerária, ele sabe), que gastou também com o MBL, o Movimento dos Boçais Lambedores. Aqueles que saem com a camisa da CBF, outra instituição idônea.

Os problemas graves para o Golpe: a perícia técnica do Senado inocentou Rousseff. Não só, para piorar tudo, o Ministério Público acaba de inocentar Rousseff. Chovem no molhado, porque sabe-se que Rousseff é inocente desde antes da pataquada começar com aquele dia na memória da infâmia universal, o 17 de abril de 2016.

Muito pior ainda. Olhem o que está havendo no exterior:

Manifesto de parlamentares franceses publicado no Le Monde:
"Dilma Rousseff é vítima de uma baixa manobra parlamentar".
Leia aqui em português.

Deputado Alan Grayson, 
denunciando o Golpe brasileiro em Washington: 
"democracia importa".

Inocente. Muito bem: como justificar agora o Golpe? A Folha de São Paulo corre ao socorro. 

Se a pesquisa do Datafalha (sempre errando no que interessa, como os antigos pintores caprichavam no retrato de seus nobres senhores feíssimos) mostrava antes que 60% queriam que Temer fosse chutado de seu trono usurpado (& escrevam o que digo: 60% era um número que já enfeitava o retrato feio demais para ser publicado convenientemente pelos capachos), agora 50% quereriam que ele ficasse.

Ah, é?

Isto aqui não existe, ok?

Nem isso: nunca aconteceu

Não, não soubemos disso aí

Não vimos nada, nada. Na Globo, jura?

Fica Temer?  Onde? 

Só no Datafalha, porque nas ruas, nos shows musicais, nos teatros, na FLIP, no exterior, nas divertidas entradas ao vivo da comparsa do Datafalha, a TV Golpe, em qualquer lugar onde você for, só dá FORA TEMER.

A Folha, como toda mídia de massa no Brasil, é pró-Golpe, como a jornalista Sue Branford demonstrou - abaixo, na postagem anterior, do vosso Demônio. Foi pró-Golpe de 1964, como vimos acima, & eis aí a demonstração, também, de que velhos hábitos não são fáceis de largar.

O melhor: o que está pressuposto é a aberrante legitimidade que se arroga no lugar da democracia dos 54 milhões de votos que elegeram Dilma Rousseff. É como se dissesse: "ah, então é o  que o povo quer". Mas respeitar o que as urnas disseram, o modo efetivamente legítimo de se ter uma democracia, o legítimo "o povo quer", não, isso não, se der o contrário do que queríamos.

Mais duas imagens, que valem mais do que mil palavras & 45 mil reais, sobre como a mídia cozinha sua mentira conveniente. 

Isto aqui é o golpista dando as caras, por assim dizer:

"Senhor, o senhor é baixo, mas o povo ainda está vendo"

E isto aqui é Rousseff:


O Datafalha? Honestamente, nem acho que preciso dizer mais nada. 

Livros de História & pesquisadores terão um prato cheio de vermes ao estudar este nosso período. Os golpistas, reduzidos única & exclusivamente, hoje, ao não-argumento: querem porque querem Rousseff fora.

"Fora", diriam eles, "e leve junto a democracia".

ADENDO (19/07/2016):

O JORNALISTA ESTADUNIDENSE GLENN GREENWALD, DE THE INTERCEPT, DEMONSTRA QUE A FOLHA PRATICOU FRAUDE NA PESQUISA PARA AJUDAR O GOLPISTA MICHEL TEMER:

domingo, 10 de julho de 2016

QUEM É QUEM, EM 7 VÍDEOS

Quarto mês,
Ano I do Golpe de Estado: ditadura de Michel Temer


"É só dar corda", como diz o velho deitado. 

Aproveitando que deram o pré-sal de presente para o capital internacional & que uma jornada de trabalho de 80 horas semanais foi proposta (além do aumento de impostos : eu disse que você ia pagar o pato da Fiesp, não disse? perdeu, pó pagá), vamos a uma pequena antologia da sinceridade involuntária, motivo daquele riso, o chamado riso machadiano.

Amostra grátis de algumas figurinhas do atual Golpe. Este Demônio assegura a diversão, porque não tem jeito (pobre Ionesco): é um teatro do absurdo.

E presto aqui também um serviço público, mostrando para o eventual golpista ainda perdido num possível sonho de belezas desse golpezinho de poltrona o naipe dos tipos a quem se mistura indissociavelmente.

1) Eliane Cantanhêde, jornalista (a gente se refere à formação de que diz o diploma, natürlich) favorável à derrubada de Dilma Rousseff. Jornalista da "massa cheirosa":


"Um partido de massa, mas uma massa cheirosa"

2) O inelegível, o golpista, o interino, o usurpador, nosso incomparável liliputiano, que chamou o lacrimoso Eduardo Cunha de "batalhador" (terá ele batalhado pelas contas na Suíça?): "A senhora presidenta utilizaria o avião para ir fazer campanha denunciando o Golpe". Essa é uma das mais bonitas, porque ele nem pisca ao admitir o que o levou ao ambicionado troninho. Vejam como fala bem, o sem-voto:


"Denunciando o Golpe ... denunciando o Golpe ..."

3) "O erro da ditadura foi torturar e não matar", disse outro dia o Bolsonaro, que no entanto apelou humildemente aos ministros do STF que não o condenem em processo movido contra ele por incitação ao estupro. Muito comovente, o seu apelo humilde. Mas Bolsonaro não é conhecido por falar tão fininho quando o deixam à vontade. "Você com o revólver na mão é um bicho feroz, feroz". Aí é golpista de verdade, sem medo (sequer de dar um mosh na multidinha fascista outro dia, que deixou seu mito se estatelar no chão):


"Se vai (sic) morrer uns inocentes, tudo bem"

4) O, ah-ham, intelectual FH (que acima seu colega de Golpe sugere singelamente matar) mostrando seus dons notáveis em língua inglesa & seu modo peculiar de driblar aberrantes contradições + alguns fatos, com um repórter que não dá moleza: "Ai prótest! Ai prótest!"


"Dis is nó tuu!"

5) "Se ela tivesse cometido crime", admite Jabba The Hutt (como depois a inocência de Rousseff estaria provada pela perícia do Senado), dizendo que o, ah-ham, "julgamento" é ah-ham, "político".



Ahn-hum-mmm-eh-uhh

6) Otávio Frias, dono da Folha, numa fria (perdão, foi inevitável): Sue Branford, jornalista britânica da BBC, aponta diversos fatos & mesmo o recente rebaixamento brutal do Brasil em termos de jornalismo pela ONG Repórteres sem Fronteiras. Frias não gosta, mas seu jornal teve envolvimento direto na campanha de desmoralização ativa de Rousseff, campanha que preparou o & conduziu ao Golpe (como todo mundo sabe, no exterior, que é o que fez a mídia de massa - cheirosa? - brasileira, & não foi diferente em 1964):

"Para que se consolide a democracia no Brasil, a grande
mídia precisa mudar"


7) Para acabar bem (também gosto de finais felizes, pessoal), vamos lembrar como ratos são tratados aqui & no exterior:



Vale a pena ver de novo

sexta-feira, 8 de julho de 2016

O GOLPE, NA LONDON REVIEW OF BOOKS

Quarto mês,
Ano I do Golpe de Estado: ditadura de Michel Temer


Kathleen McCaul Moura

A jornalista & escritora britânica Kathleen McCaul Moura publica na London Review of Books um artigo sobre o Golpe de Estado no Brasil de 2016, escrito em parte por meio de conversas que mantivemos, ao vivo & por e-mail, sobre a situação. McCaul também utiliza informações de observação direta em 2015, de múltipla leitura de artigos & de Golpe: antologia manifesto.

O artigo se chama "We are favela!":


Ao mesmo tempo, disponibiliza no site da revista New Writing, da University of East Anglia, alguns poemas meus, em sua tradução para o inglês, nos quais a situação social do Brasil é aparente. A edição é de Nathan Hamilton, escritor & antologista. 


O vosso demônio

terça-feira, 5 de julho de 2016

LEONARDO FRÓES NA FLIP

Quarto mês,
Ano I do Golpe de Estado: ditadura de Michel Temer



Leonardo Fróes é um grande poeta, coisa óbvia desde 1968, aquele outro annus terribilis da nossa triste vida pública em que fez sua extraordinária estréia em livro, o Língua Franca, que já começa com o ótimo "Homenagem a Louise Labé" (trecho final):

o coração range
         a raiva me cega, tropeço nos livros
antes talvez tomasse um drinque
mas não há tempo
                             não há misericórdia
um tigre ronda o quarto
j'ay chaut estreme en endurant froidure
           perdi todos os rumos e
nessa altura da vida, às três da tarde,
já não sou um misto de orgíaco e scholar
procuro uma emoção bem simples
                                          um rosto
              no qual me reconheça.

Longe do papo furado das grandes editoras & do jogo de cartas marcadas do circo literário, da crítica com a cabeça enfiada num buraco no chão, ele fez sua carreira em um silêncio que nada tem a ver com o fato de residir há mais de 40 anos em seu sítio afastado da estupidez brutal do correr atrás do próprio rabo das grandes cidades. Seu silêncio é o do topo de montanhas, com o que esse silêncio tem de grande eloqüência, também, se lembrarmos que os poemas de Chinês com Sono, seu livro de 2005, estão repletos dessa quietude enérgica, das palavras exatas de quem já escreve com um pensamento que é poesia. 

PROXIMIDADE

É madrugada e os braços da neblina,
com seus longos fiapos, me contornam.
Sinto-lhe os toques de carícia quando
a neblina se solidifica em meus ombros.
Ele é o real que me estreita em seus domínios
e o real que liberta.
Sinto-lhe as mãos, o rosto, as coxas
a roçar em meu sexo.
Sinto sua boca refrescando a minha.

E isso acontece com raros poetas, i.e, esse refinamento tão absoluto do processo que o próprio pensamento se torna poesia, a trama se torna inconsútil - como Jorge de Lima chamava aquela túnica. Aí está porque as pessoas no público estavam todas absortas, hipnotizadas, comovidas com esse tipo de integridade que dá a coesão total entre o homem & o poeta.

Alguns jornais trataram sua ovação em pé neste último sábado na FLIP - a Festa Literária de Paraty deste 2016 - como uma "redescoberta": & é como escreveu a poeta Julia Mendes na Revista Saúva, "onde é que estavam as pessoas nesse tempo todo?". Exatamente. Não se trata de uma redescoberta, mas de uma atenção tardia que não é culpa, em última análise, das pessoas. Costumo dizer que as pessoas não têm como saber de algo que existe se elas não sabem que existe. As pessoas estavam distraídas com outras coisas fracas & nocivas que a propaganda lhes faz descer goela abaixo (o mesmo esquema que se dá com a política, como temos visto).

As editoras brasileiras (assim como a crítica) têm um problema com literatura, particularmente poesia: dificilmente se acha quem entenda do assunto em posição de editoria, de escolher, do velho processo de krino, krineín, da palavrinha que deu em crítica, & que significa discernimento, o saber separar o joio do trigo. Com essa dificuldade peculiar, em geral se tem o velho esquema de gato por lebre.

No sábado passado o público na tenda dos autores pôde saborear diretamente a melhor poesia que tem sido escrita no Brasil & em qualquer parte deste planeta azul. Sérgio Cohn, editor da Azougue que é amigo de longa data de Fróes, & que também de longa data o tem impulsionado à atenção pública, orientou a conversa-leitura com a familiaridade de quem conhece uma obra até de trás para frente. A base de onde tudo saltou é a recente antologia de sua obra poética publicada pela Azougue, Trilha (poemas 1968-2015), que tem como capa a bela & muy significativa foto batida pela esposa do poeta, Regina.


Fróes deve ser lembrado também por ser uma referência quase onipresente na poesia brasileira escrita por poetas mais jovens, não importa que espécie de poesia escrevam, & isso é igualmente um atestado de sua vitalidade única. Se eu & o também poeta Ricardo Lima o entrevistávamos em 2006 para a revista online Germina Literatura (que traz também um especial sobre Fróes); a poeta Jeanne Callegari me pediu em 2014 que o entrevistasse para uma matéria na revista Vida Simples; Ricardo Domeneck escreveu um artigo sobre Fróes para a revista Modo de Usar, com pequena antologia de poemas em 2011, e convidou o poeta para o Festival Artes Vertentes de 2014; Reuben da Cunha Rocha prefaciou a reedição, pela Chão da Feira, em 2015, de um dos marcos da poesia de Fróes, Sibilitz (1981) - & lembramos que uma das editoras da Chão da Feira é a poeta Julia Hansen -, etc.

Gabriela Capper, Alberto Pucheu e Sérgio Cohn fizeram o ótimo documentário-depoimento de Fróes, Leonardo Fróes: Um Animal na Montanha, que vale a pena ver. Aqui:




Aquele começo de tarde em Paraty, ao lado do rio Perequê-Açu sob um céu todo azul & sol, os barcos coloridos às margens & aquele casario colonial que é a fama do centro histórico da cidade, restituiu às pessoas o seu poeta, como há muito tempo não se via acontecer nesta época em que o mais comum é a velha barreira. Quebrando o protocolo - & a imaginária barreira - Fróes dirigiu-se ao proscênio para se aproximar da audiência & agradecer a cada um pelo encontro. 

Um gesto cheio de poder simbólico, para renovar esperanças em tempos difíceis.

*

Em tempo, Augusto de Campos volta à esgrima com Ferreira Gullar, esgrima que não me interessava até agora, mas diria touché bem neste ponto, acompanhem:

"Para piorar, o Acadêmico Ferreira Gullar acena-me com um prêmio de R$ 300 mil da Academia Brasileira de Letras, que eu deixaria de levar, apesar do seu "placet", por ter criticado a entidade. Ora, somos mesmo pessoas completamente diferentes. Como somos poetas diferentes. Isso, sim, é um insulto. Jamais aceitaria qualquer prêmio, de que valor fosse, vindo dessa instituição, que considero inútil, caduca e até nociva, pelo mau exemplo que dá a cultura brasileira, acolhendo gente que nada tem a ver com literatura –velhos políticos, governantes, empresários e jornalistas conservadores– uma confraria de mediocridades que se chamam despudoradamente de "imortais", envergando fardões, espadas, colares e medalhas. Com raríssimas exceções.

Nego-lhes autoridade para conferir prêmios e prebendas. E encerro com as palavras de um poema instrutivo e fácil de entender: NÃO ME VENDO / NÃO SE VENDA / NÃO SE VENDE."

Xeque-mate.

É outra brisa de ar fresco alguém dizer em público, sem rodeios, o que é a Academia Brasileira de Lesmas. E está cheio de golpista lá dentro, como não poderia ser diferente.

Com raríssimas exceções.