quarta-feira, 8 de junho de 2011

ADENDO À HISTÓRIA UNIVERSAL DA INFÂMIA

Painel com vitral no meio, ambos de Enio Squeff, para os 450 anos de São Paulo. Feito para o SESC Itaquera até o SESC Itaquera decidir desmontar tudo.



Enio, caríssimo,

soube da estupidez que fizeram à sua obra. Não vou dizer que estou especialmente surpreso, porque não me lembro do Brasil ter cuidado com obras de arte ao ar livre (curiosa palavra, no contexto). Não cuida sequer da arte que tem o gesto curioso de enfiar em um museu, ou em bibliotecas.

O gesto particularmente troglodita de sumir com a obra, e obra recente, e planejada precisamente para aquele espaço, de fato cria uma nova definição para a estupidez humana em geral, e para a brasileira em particular.

Nem vou fazer a piada (porque seria piada) de que poderiam ao menos ter te avisado. Teria sido uma fineza de psicopata, que é coisa sobretudo inútil e potencialmente assustadora: "Enio, estamos te ligando pra avisar que vamos sumir com a sua obra imensa ao ar livre. Não, não somos bandidos, somos os caras que comissionaram a obra, mesmo".

Não sei: talvez seja um consolo imaginar que a supressão da obra será outro dia na história universal da infâmia, a partir do qual as pessoas se alarmem e pensem que algo está muito errado, que alguma coisa está realmente do avesso numa sociedade em que esse tipo muito regressivo de imbecilidade é possível.

Talvez eu argumente muito por causa do meu esforço de compreender o que vai (se algo vai) na mente nebulosa & rude que chega a uma decisão dessas, porque você sabe o quanto aprecio sua arte notável, e sabe o quanto julgo que a subestimam. Ela é um tesouro nacional, como a de outros artistas, & o país, hélas! não sabe disso. O país é sempre o último a saber.

Não iam mexer com você se você fosse a Lady Gaga, obviamente, porque um time de no mínimo 15 advogados tubarões acabava com a raça deles antes que pudessem cogitar a hipótese de pedir genuflexórias desculpas.

Não posso ir vê-lo para dizer isso tudo em pessoa, que estou em Londres, então digo aqui: fique forte, fique bem, meu amigo. Décadas atrás, aqui, quebravam as esculturas do Jacob Epstein. Sir Jacob Epstein. Ainda haverá justiça. Como você disse ironicamente no fim de uma entrevista que fiz com você há alguns anos: "Hei de vencer". Vencerá, sim.

3 comentários:

Fábio Romeiro Gullo disse...

Pois é, amigos, não sei se estou emotivo ou o quê, mas uma ação dessas me mareja os olhos, não quero sequer estar por aqui em prováveis tempos mais difíceis...

Julia Filardi disse...

O Brasil é um país onde seus artistas não são valorizados por serem brasileiros e assim reconhecidos aqui, mas antes, estes precisam ser vistos por olhos estrangeiros para depois merecerem alguma visibilidade em terreno brasileiro. É de se lastimar e indignar muitíssimo,com muito pesar li o acontecido. Só mesmo sendo muito guerreiro e de muita fibra pra não sucumbir à banalização à q a arte, de um modo geral, está sujeita. Quem tem espaço são os bons marqueteiros q se confundem com artistas, os genuínos, aqueles q se entregam de corpo e alma à sua arte, passam desapercebidos ou como no ocorrido, ultrajados. É por isso q muitas vezes, apenas procuramos que os raros verdadeiramente artistas, possam, entre si dar as mãos. E isso pode valer muito mais do q o reconhecimento de pessoas q vivem num mundo capitalista e utilitário. Perceber seu gesto público de apoio ao Ênio, Dirceu, deixa isto evidente. Que os raros entre si se reconhecem.

Anônimo disse...

Não posso dizer que estou emocionado. Isso daria forças à canalha que destruiu minha obra. Mas me enternece a solidariedade ã arte, a todas elas Sinal de que a Inquisição encontrará resistência onde talvez talvez ela não desconfie que exista. Ironias à parte, como me lembrou o amigo Dirceu Villa - hei devencer! Baci per tutti.
Enio Squeff