quarta-feira, 14 de outubro de 2009

O bilhete em versos de Evaristo da Veiga


Conversando com Ricardo Domeneck (poeta & crítico ativíssimo que você acha nos links ao lado para Rocirda Demencock, Hilda Magazine & Modo de Usar), ele me pediu o nome do poeta que mencionei há coisa de um mês num debate, autor do "Bilhete em verso ao Thomaz".

Estava em Belo Horizonte quando Domeneck me perguntou & não me lembrava, que a memória é um dom suscetível. Disse-lhe que veria ao voltar. Era o Evaristo da Veiga (1799-1837), livreiro, poeta, maçom, político pela independência, etc.: o simpático & rotundo cavalheiro de olhos cheios de candura, acima.

Aí vai, para o meu caro Ricardo & para os interessados leitores deste Demônio preguiçoso, o curioso & esperto poema, que tem parente ancestral no descort, gênero dos poetas medievais, que propunham o desacordo das coisas do mundo numa pequena babel de palavras em várias línguas. Esta é uma babel mais dirigida, que cutuca um provincianismo.

Notar, também, a ironia com a composição de um poema (a intromissão do francês que acusa a filiação evidente & em geral acrítica dos poetas do período, sombra de sombra de sombra, que por sua vez buscava mecanicamente o latino que buscara uns gregos, que terão buscado a refração da idéia neste mundo de pó), o "contar pelos dedos". Gaudete.


Bonjour Mr. Thomaz, comment se porte:
Je suis ravi de voir que o seu visage
Dá de bonne santé toda a apparencia:
Moi pour votre service; aqui lhe trago
Mon paquet poetique, que he composto,
D'un rang, ou rango de versinhos soltos,
E d'un Ode; oh que Ode! coisa boa!
Quatorze estrophes tem todas inteiras,
Sem que lhe falte ao menos um só verso:
As sílabas também (ou je me trompe)
Não tem falta nenhua, nem sobejo;
Contei-as duas vezes pelos dedos,
Duas vezes me deo a conta certa.
Não arrepare nesta Francezia,
Que c'est l'usage cá da nova escola,
Que se moquant do ranço dos antigos,
Já banirão das suas livrarias
Andrade, Coito, Barros, e Lucena,
Que serião peut être bons Authores,
Se soubessem Francez; se que dois dedos;
Mas assim fazem dó, Je vous demande
Pardon da secatura; e como finda
Aqui o meu papel, também eu findo.

6 comentários:

gilson figueiredo disse...

é musica! &, qndo à preguiça, tens sangue baiano? hahahahaha

Dirceu Villa disse...

Hahahahaha. Serve maranhense?

A preguiça é sempre a horaciana, a do ócio com dignidade.

Mas no vício do tempo como dinheiro chama-se "preguiça" ao tempo qualitativo da invenção.

O tempora o mores, hahahaha.

Abrazo,

D.

gilson figueiredo disse...

"j’ai vu l’ombre d’um coche qui,
avec l’ombre d’une brosse,
l’ombre d’um carrosse"

diz o poema educado, culto até.

qndo ao tempero ds veias, acho que é boa hereça aquela que reclama beleza ao tempo desoculpado,

abraço caríssimo.

ana rüsche disse...

me engana que gosto - dirceu, preguiçoso?, sei, sei.

só vcs para me fazerem rir.

beijos e bom domingo

paulo de toledo disse...

muito bom, dirceu!

abbracci,

paulo

Gabriela disse...
Este comentário foi removido pelo autor.