domingo, 20 de novembro de 2011

NOVO CAPÍTULO NO PLANO DE DESTRUIR A UNIVERSIDADE PÚBLICA

"Ah, tá vendo, tinha que ser: tudo baderneiro, maconheiro, filhinho de papai".


O governo pensa: "dessa vez vai"

O velho plano de acabar com a universidade pública em São Paulo, que não conta apenas com os anos recentes de democracia mas acha suas raízes no golpe militar de 1964, está a pleno vapor.

Mas é pior, naturalmente: é o triunfo de um tipo de mentalidade regressivo, péssimo sinal.

O melhor dos mundos possíveis: o homem biônico

OU talvez se trate, por outro lado, de uma ótima notícia: significaria que o governo resolveu o problema da segurança pública e não tem nada melhor para fazer com 400 policiais militares, helicóptero & demais aparatos repressivos do que mandá-los dar distração na Universidade de São Paulo ao respeitável público dos telejornais.

E talvez haja uma saudade (sempre ouço gente saudosa daqueles tempos) da figura tutelar do ditador, que indicaria o governador, que então ostentaria o poderoso adjetivo "biônico", com a sugestão dos poderes extra-humanos do Homem de 6 Milhões de Dólares.

Imprensa livre, com sonetos & receitas

O curioso é que brigava-se por liberdade de imprensa nem faz muito tempo; a idéia é a de que a liberdade de imprensa faria com que alguma verdade circulasse.

Durante a ditadura, as verdades inconvenientes eram substituídas por receitas de bolo ou sonetos de Camões; hoje, a imprensa é chamada "livre", porque o governo sabe que não precisa de censura: os donos do poder são também os donos da notícia, e a imprensa é meramente instrumental desse mesmo poder.

Poderiam ao menos nos dar umas boas receitas de bolo ou uns sonetos quinhentistas.

Conhecimento que não serve

Mais curioso ainda é que governo & imprensa podem contar com a opinião pública, como aconteceu em 1964 também. Há uma desconfiança de qqer espécie de conhecimento, mas, sobretudo, desconfiança de um conhecimento que não serve.

Não por ser imprestável, mas porque não é servil.

"Os livros não nos dizem nada"

Quanto à desconfiança contra o conhecimento, basta assistir ao filme que Truffaut fez a partir do livro de Ray Bradbury, Fahrenheit 451 (1966). Naquele futuro, obviamente distante ou impossível, se reprime o pensamento e as liberdades e as pessoas não lêem nem vivem, mas passam seu tempo como zumbis hipnotizados por programas estúpidos em telas enormes de TV na sala.

Na ficção os bombeiros não apagam incêndios, mas incineram os livros que os baderneiros e subversivos insistem em ler e guardar. A cena na qual esses bombeiros invadem a casa de uma senhora que escondia uma gigantesca biblioteca nos dá, no discurso feito pelo capitão, o motivo do rancor contra o conhecimento.

Ele afirma: "Os livros não têm nada a dizer"; os romances são histórias sobre pessoas que jamais existiram, que tornam os leitores infelizes com as próprias vidas; a filosofia não dá uma resposta definitiva, e latim, por que alguém estuda latim, não é uma língua morta?

Todos têm de ser iguais, isto é, igualmente ignorantes de tudo, numa satisfação policiada, de ordem imposta, e sedativos de TV e remédios.

A especialidade brasileira continua

Durante a leitura em homenagem a Roberto Piva, dias atrás, tive de mencionar o fato de que vivemos uma época de conservadorismo patológico. A vitória desse governo, que há mais de 20 anos vem destruindo a Universidade de São Paulo, é apenas a parte mais aparente da escravização mental em curso.

A mim foi espantoso saber (não por qualquer veículo de imprensa, que covardemente não se menciona o assunto) que alunos eram revistados saindo da biblioteca.

Coisa do tipo, desse tipo de indignidade, era de quando o país estava sob uma ditadura. Estratégias nazi-fascistas de controle em pleno curso sob a nossa, ah-ham, "democracia".

Mas é muito sintomático que esse coup de grâce, esse golpe do governo, seja feito como é a especialidade brasileira: com uma invasão militar.

Mais espertos ainda: a coisa é proposta agora dentro da legalidade.

E você que achava que eles não aprendiam, é ou não é?

Contra a lavagem mental em curso

Contra a lavagem mental da imprensa sugiro, àqueles que querem saber o que de fato se passa, a aula pública que o professor de literatura brasileira da USP, João Adolfo Hansen, deu há alguns dias diante da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas.

A aula começa nos 2:30 min. do primeiro link do youtube, e segue pelos restantes.





6 comentários:

cahoni chufalo disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
Dirceu Villa disse...

Cahoni,

tudo é perfeitamente discutível. Deixa de ser perfeitamente discutível quando envolve a polícia militar.

E "prejudicando as aulas desses alunos" também é algo discutível. A longo prazo está em jogo muito mais do que um punhado de aulas deste ou aquele aluno, boas ou más.

cahoni chufalo disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
Dirceu Villa disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
Dirceu Villa disse...

Mas considere que há questões anteriores: essa invasão da reitoria (seja lá como se queira definir) aconteceu depois da polícia militar ser, ah-ham, instalada no campus.

Essa é a verdadeira questão e a número 1, que precipitou as demais. E é parte de um velho plano, que já teve diversas etapas.

Aí se tem um seríssimo prejuízo em curso, e para todos os alunos e professores. Pra nem dizer o prejuízo para a sociedade, que graciosamente entende a coisa do avesso.

É um bom plano, como se vê. Por isso que vem acontecendo há mais de vinte anos.

Abrazo,

D.

pedrorossetto@hotmail.com disse...

concordo quanto ao caráter de "plano" do que vem sendo movido à universidade de são paulo, num processo no qual a imposição do atual reitor, processado por improbidade administrativa, contra o resultado das eleições internas, e o conluio da mídia com as posições do governo frente aos conflitos internos são apenas um episódio recente.
se tomarmos um horizonte de vinte anos como início dessa história, voltamos ao início dos anos 90.
sou testemunha do fechamento gradual do campus ao longo dos 90 que resultou no caráter ermo que hoje existe e que em muito contribui para a falta de segurança.
é também dos anos 90 o processo de crescimento das redes privadas, de caráter eminentemente técnico ou não-universitário. hoje o próprio grupo abril é também dono de rede privada de ensino, para além dos contratos de fornecimento de material didático com o governo.
apesar disso, suspeito valeria recuar ainda outros 20 anos o início da coisa toda, dos 90 pro início dos 70: mec/usaid e reforma universitária...